O renascer dos electrões…

Com a aquisição da mota em 2010, começou a nascer em mim uma nova paixão, o gosto pelos veículos elétricos. O gosto pela mobilidade sustentável e económica já eu mantinha, pois tinha por hábito deslocar-me para o trabalho de bicicleta. Os 30 km que percorria diariamente, ajudavam-me a manter a forma física e garantiam-me horários de chegada isentos daquelas parvoíces típicas do trânsito automóvel. Possuía já assim o hábito de viajar em 2 rodas, no meio dos fumarentos, sem ruído, sem emitir CO2 e sem ter de usar mangueirinhas para meter a gota e ser assaltado todas as semanas por um funcionário de uma gasolineira. Por tudo isto, a mobilidade que a scooter elétrica me veio proporcionar já me era familiar. Quando a mota elétrica ia para reparar, eu voltava à bicicleta. Quando a mota elétrica avariou e o litígio deu lugar a um processo em tribunal, eu voltei também à bicicleta. Foi neste período, que um dia a minha bicicleta desapareceu do meu local de trabalho. Tinha sido roubada. Claro, nunca a consegui reaver. Queixa na polícia, individuo identificado por câmaras e até capturado, e de súbito, processo arquivado. Este foi um bom prenúncio para o desfecho de falência, que mais tarde viria a ocorrer, relativamente ao processo da mota elétrica em tribunal. Foi um ano espetacular!

Sem o meu VE, sem a minha bicicleta e sem qualquer perspetiva de resolução do litígio, acabei por adquirir uma scooter poluente e barulhenta para as minhas deslocações diárias. Sempre tive em mente que se trataria de um veículo de transição, que seria “abandonado” quando pudesse voltar a depender dos eletrões. Hoje, este mesmo charuto de duas rodas está parado. Chamo-lhe de backup e assim manterá essa função por mais uns meses, altura em que voltará ao ativo quando parar o VE para uma primeira revisão e intervenção. Após o retomar da normalidade elétrica, possivelmente procurarei um dono que goste de fumar.

A paixão de que vos falava há pouco sobre os VE, começou também cedo a evoluir para o gosto mais técnico sobre o funcionamento dos mesmos. Rapidamente, comecei a pesquisar informação em fóruns e a criar o meu Diário de Bordo onde tentava também aprender com as respostas que obtinha aos meus posts. É por intermédio de um desses fóruns, que venho a conhecer alguém que também tinha comprado uma scooter elétrica (marca diferente da minha) e que por acaso até trabalhava próximo de mim. Combinámos um almoço e hoje somos amigos. A vida tem destas coincidências. Perde-se uma mota, uma bicicleta, dois processos em tribunal mas ganha-se um Amigo. “Não há coincidências”, diria ele. O seu nome é Hélder e estou tão certo que um dia ele vai fazer também um projeto na área da mobilidade elétrica, que deixo já aqui espaço para mais tarde juntar o link ___________________.

A amizade com o Hélder abriu horizontes. O rapaz, mais entendido do que eu, ensinou-me coisas e mostrou-me novas fontes de informação que mais tarde também aqui as partilharei, dada a sua importância nas decisões tomadas ao longo deste projeto. Acima de tudo, o Hélder veio transmitir a confiança que eu não tinha e a coragem que eu não sentia em dar o passo decisivo – pegar na sucata que restou da mota elétrica e fazê-la renascer. Não tenho dúvidas que sem o Hélder não teria feito o que fiz.

Outra figura chave foi o Nuno João. Conheci-o primeiro no fórum Nova Energia e mais tarde, pessoalmente, através do Hélder que era já seu amigo. Sempre acessível, disposto a ajudar e sempre pronto a explicar o básico a um leigo, o Nuno foi sempre uma excelente base de conhecimento a quem eu pude sempre recorrer, tendo dado o seu precioso contributo também a este projeto.

Bem acompanhado e melhor ainda suportado, tomei então a difícil decisão de avançar com esta maluquice. E porquê difícil? Porque na verdade quem ia executar o projeto era eu. Era eu que ia também despender o dinheiro na aquisição do material, sem quaisquer garantias de sucesso. Sempre fui muito ponderado e a decisão de avançar, ou melhor, a decisão de arriscar, constituiu uma vitória sobre o ‘eu’ mais conservador.

A minha estratégia passava por me livrar dos componentes que tinha. Vendi tudo! Controlador, motor, carregador, DC/DC, pneu… qual casal divorciado que se livra dos bens para fazer esquecer a outra parte, também eu me quis livrar do que tinha para ajudar a esquecer um passado mais sofrido. Queria começar do zero. Outro dos motivos para esta minha atitude, teve a ver com o facto de a scooter possuir componentes difíceis de substituir em caso de avaria. Exemplo disto, era o controlador e o motor de 6 fases. É muito mais fácil encontrar motores de 3 fases e controladores para eles. Na verdade, estes motores são um “dual three phase Brushless DC motor“, comandados por um “dual three phase BLDC motor controller“. As supostas vantagens destes motores são: funcionamento mais silencioso, maior eficiência, maior binário, menor temperatura… mas rapidamente estas vantagens se transformam em desvantagem, quando é necessário substituir qualquer um deles.

Motor e controlador de 6 fases e carregador, retirados da versão original para venda

Motor e controlador de 6 fases e carregador, retirados da versão original para venda

Pormenor da cablagem das 6 fases do motor

Pormenor da cablagem das 6 fases do motor

Estava agora na altura de ir às compras mas primeiro, precisava perceber qual era a refeição que desejava para escolher os ingredientes adequados. Pretendia poder deslocar-me para o trabalho com pendura, garantir um mínimo de 50km de autonomia sem grandes concessões ou preocupações, atingir velocidades de cruzeiro na ordem dos 80km/h, fazer picos de velocidade próximos dos 100km/h, ter opção de travagem regenerativa e por último, possuir carregador onboard para poder carregar a bateria fora de casa, se necessário. Estes eram os ingredientes principais. Claro, por acréscimo viria sempre algo mais para ornamentar o prato.

A escolha natural recaiu assim sobre uma conversão de uma scooter já de si elétrica. Sim, é estranho falar nestes termos em conversão mas acho que no final, se resistirem aos meus posts e eu sobreviver aos vossos comentários, vamos chegar todos à mesma conclusão. Tirando o facto de não haver motor de combustão para extrair do veículo numa primeira abordagem, tudo o resto se enquadra no perfil de uma conversão para veículo elétrico.

A decisão estava tomada, era o renascer dos electrões e para esta decisão contribuiu, e muito também, uma pequena chapinha com um código alfanumérico. Neste projeto, esta chapinha, separa o ficar na garagem do poder sair para rua e queimar uns eletrões ao ar livre. Trata-se tão simplesmente do número de série do veículo, o passaporte da Morcega para a liberdade. Graças a ela, o Estado Português e o Instituto de Mobilidade e dos Transportes reconheciam e documentavam já o veículo como elétrico. Este simples reconhecimento, dispensava a rainha da Inglaterra de atestar por escrito, com bico de pena de galinha virgem inglesa, um documento a autorizar a conversão para efeitos de homologação. Em Portugal, é claro!

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2 Responses to O renascer dos electrões…

  1. Nuno says:

    A história começa a desvendar-se. E realmente, que grande escritor este nosso amigo se está a revelar. Tenho que ter cuidado se me quiser manter na vanguarda… Alguns outros amigos aguardam para deixar sair o escritor que lá têm dentro :). Agora vejo como sabe bem estar sentadinho só à espera de os ver chegar regularmente, e então com esta qualidade :)! Cá estamos para continuar, com muito gosto, a dar qualquer ajuda que seja preciso!

  2. Helder says:

    Amigo, da parte que “me toca”, acho que estás a exagerar. Esse “animal” capaz de converter uma scooter como tu fizeste, está e sempre esteve aí dentro. Para mim foi um privilégio seguir esta conversão, e é um privilégio ter-te encontrado e pelo assunto que nos juntou. Dizes e muito bem, não há coincidências, por isso espero novas, variadas e frutuosas novas situações que nos mantenham juntos.

    P.S.: É incrível que neste anos que já te conheço não tenha reparado nesta tua excelente veia escritora! 5* este post, assim como os anteriores.

    P.P.S.: Nuno João, também escreves muito bem, tens um defeito… em poucas semanas o Sérgio já escreveu quase tanto como tu LOL! Estás a ficar para trás amigo… 😉

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